quinta-feira, 16 de março de 2006

Fim?

A vida é assim. Um ciclo acaba, outro começa. Quando você olha para os lados, percebe que muita coisa está perdendo velocidade para ser acessada pela sua memória e está ficando para trás. E cada vez mais para trás, até que se perde no horizonte e cai naquele abismo que os antigos navegadores temiam. Aquele medo era uma metáfora - quanto mais para longe vai, maior é a probabilidade de não se lembrarem de você em seu possível retorno.

A vida passa rápido, sobrepõe ciclos, mas não é injusta. Nós sempre temos a chance de prender as coisas que mais queremos juntas a nós. Como se nossa mente amarrasse a ponta de uma corda na nossa memória e a outra no navio. Além daquela âncora providencial que fica preparada para qualquer mexida mais forte no mar, pronta para ser lançada e salvar o barco. Acabo de comprovar sua justiça.

Três despedidas em seis meses. Deixo os que amo e vou para longe, aprendo a amar os que encontro longe e volto para os que amo e que estavam longe e, como se não bastasse, me despeço dos primeiros mais uma vez - culpa de uma tempestade previamente prevista chamada formatura. O mar ficou revolto, a insegurança tomou conta do único tripulante fixo da embarcação, os horizontes se cruzaram por alguma ilusão de ótica ou delírio de pré-loucura. O medo de ficar eternamente à deriva, antes oculto, resolveu dar as caras e mostrar como seria a minha vida em um futuro solitário.

Precisou eu fazer a travessia duas vezes e me despedir três para entender que as coisas boas não se apagam assim; tampouco as pessoas somem por detrás de qualquer nevoeiro. Depois de meio ano encontro meus amigos ainda meus amigos, e vejo meus amigos que ficaram do outro lado ainda meus amigos, e vejo que formatura nenhuma nem mais estudos ou trabalhos ou filhos ou famílias ou quilômetros podem destruir o que foi tão bem construído, feito para navegar por toda uma vida.

Cada fase de nossa vida tem seu valor, e mesmo o que parece ruim pode ensinar coisas maravilhosas. Nada como estar longe para saber o quanto se gosta, nada como a ameaça de separação para querer estar junto, nada como ver que as pessoas que você ama compartilham suas tristezas e suas alegrias com a mesma intensidade e nenhuma ponta de maldade ou inveja. Nada como ter a certeza da confiança.

Amigos, para mim, são pessoas em quem confio plenamente, pessoas por quem arriscaria minha vida se fosse preciso. Pessoas por quem luto até o fim e apóio e acredito sempre, em tudo o que digam ou façam. Lindo é ver que muitos pensam o mesmo com relação a mim. Por isso não tenho vergonha de dizer que chorei quando fui para a Europa, chorei na minha despedida em Sevilla, chorei no final da formatura. Porque as pessoas por quem derramei minhas poucas e difíceis lágrimas valem a pena.

Foi assim que descobri meu porto seguro.

Nenhum comentário: