Se você pensou que eu ia usar uma frase de funk como recurso barato pra começar o texto, parabéns. Mas isso não vem ao caso, e sim a história abaixo.
Sábado eu quis fazer um agrado aos espanhóis, que sempre me recebem tão bem e ainda são obrigados a me aturarem com cara de perdido toda vez que vou ao Camp Nou.
nota 1: sim, Camp Nou. Dessa vez, a ver Barça x Almería. De graça.
nota 2: eu estava com cara de perdido, mas eles é que não sabem torcer. Não pulam, quase não gritam. O sangue latino faz diferença nessas horas.
Voltando, meu agrado foi assistir a partida com a camisa da seleção espanhola. Legal, né?
NOT!
No estádio, ninguém se manifestou (apesar de não poder afirmar se deixaram passar ou me olharam de cara feia). Mas, num show pelo aniversário do bairro de Sarriá, um cara veio falar comigo sobre a camisa e quem deveria ser convocado, e uns amigos do Alberto (com quem divido apartamento agora) disseram que era um erro sair vestido assim. Assunto que se estendeu no almoço da sua família no domingo e dividiu opiniões.
A verdade é que a maioria dos catalães leva a história de identidade própria pra todos os campos de suas vidas. De futebol, inclusive. Eles têm sua própria língua, seus próprios costumes e, pelo visto, gostariam de ter sua própria equipe.
Seria bom, se pensarmos que eles se livrariam do Raúl. Porém, pensando no geral, é difícil entender tamanha distância entre dois povos que formam uma única nação. Aliás, o conceito de nação aqui é muito diferente do que conhecemos e de como o entendemos. Se no Brasil a mistura das raças e tudo o que passamos ao longo dos períodos de colônia, império e república nos deu a idéia de unidade (salvo os fracos suspiros separatistas dos sulistas), aqui nem mesmo a longa história do país, com séculos de vitórias e derrotas empapadas de sangue ajudou na construção dessa mentalidade. Talvez, e vou me informar melhor, tenha até piorado a coisa. Basta pensar que, não à toa, o País Basco é chamado de País.
É complicado, depois de ver isso, falar das guerras civis africanas, por exemplo. Daqui pra lá, o que muda é o grau de violência dos grupos étnicos. Enquanto nas ex-colônias o negócio é chacina, vingança generalizada e sangue jorrando pior que em Kill Bill, aqui o papo varia entre a pressão política e atentados esporádicos - normalmente avisados com uma certa antecedência - que visam aumentar a pressão no governo.
Engraçado também que na Andalucía, por muito tempo sob domínio dos mouros, a idéia de nação seja mais presente. Talvez para fugir do estigma de terceiro mundo da dominação árabe.
Tudo isso dá à "pátria de chuteiras" um significado muito mais forte, que vai muito além de um país que só se une nos jogos da seleção e canta o hino que nem a Vanusa. Por mais que seja verdade, de certa forma.
Certo é que, em matéria de união futebolística, os espanhóis são terceiro mundo se comparados a nós. E daqui a alguns anos teremos a chance de mostrar a eles como se resmunga a letra do seu Francisco (Manoel da Silva) - com a mão no peito e lágrimas nos olhos.
Que venha a Copa de 2014!