terça-feira, 21 de março de 2006

Voando baixo

Domingo foi exibido "Falcão - meninos do tráfico" no Fantástico, e ainda hoje o documentário do MV Bill e do Athaíde é assunto nos quatro cantos midiáticos do país - podem procurar na TV, rádio, mídia impressa, Internet. Nem era para ser diferente, já que agora todos os que diziam desconhecer o problema deram de cara com ele, enquanto esperavam uma reportagem do Zeca Camargo surfando em um lago selvagem em Burundi ou o Big Brother na reta final e suas "chocantes" revelações.

Meu pitaco no assunto, o de número 1.357.416 (contados, hein?...), não é para dizer que os garotos são coitados ou canalhas, ou para discutir políticas de reintegração dos menores infratores na sociedade e possíveis punições para crimes mais graves. Até porque não sou político, delegado nem outra coisa qualquer com um mínimo de influência nas decisões. Meu negócio é com o pós-documentário.

Glória Maria anunciou o último bloco como "opiniões de famosos que ficaram chocados com a situação dos menores envolvidos no tráfico". Daí entrevistaram Cacá Diegues, Camila Pitanga e mais uns famosos. Excluo Veríssimo do que vou dizer, por imaginar que não se enquadra aqui.

Estou (estamos?) cansado de saber quem financia o tráfico. Quem não sabe de festinhas onde servem maconha, cocaína e outros em bandeja, o que rola em festivais de cinema e festas de famosos, fulano que é viciado ou beltrano que promoveu quebra-quebra porque estava doidão? Já ouvi, e de mais de uma pessoa, sobre festas onde havia famosos, ou gente da moda, e todos estavam dando seus tapas e seus tecos tranquilamente.

Aí, depois de um documentário sério, onde o problema é mostrado em sua essência, onde vemos que a falta de política do Estado empurra os jovens ao caminho mais fácil e arriscado, o de vender drogas, onde vemos crianças chapadas e sem perspectiva de vida nem futuro nem nada, a Globo tem a cara de pau de mostrar "pessoas chocadas com o problema" - que são justamente os que consomem e mantém este sistema. E os "espantados, abismados, embasbacados" artistas e famosos se dizem surpresos com o problema, já que desconheciam a situação!

E de onde acham que vêm todas essas crianças para povoar os sinais, abiogênese? "Ah, esse moleque nasceu quando colocaram juntos um trapo de roupa suja e uma arma num canto de um barraco na Maré..." Será que eles imaginavam que nascia uma criança, saudável, com excelentes condições de vida, que de repente se tornava má sem mais nem menos? E que drogas não têm nada a ver com isso, já que são tão boas? Será que todos esses coitados desconhecedores dos problemas do Brasil nunca imaginaram que aquela criança com uma pistola na mão e olhos vermelhos, que te coloca contra uma parede em uma rua qualquer, poderia estar drogada - quer dizer, sob o uso de drogas, as mesmas drogas que eles usam em suas festinhas super descoladas?

Vão para o inferno! Até hipocrisia deveria ter limites. Mas o pior é saber que o povo vai balançar a cabeça para todos eles e pensar "realmente, que bom que eles estão preocupados, agora com certeza as coisas vão mudar". E em outubro votam nos mesmos, torcem pelos mesmos, e assim continuamos os mesmos.

Se era para bagunçar, porque não entrevistaram Gabeira, Luana Piovani e Marcelo Anthony?

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